Juros baixos e dólar alto são “o novo normal” na economia, diz Paulo Guedes

‘Democracia não corre risco’

Encargos ‘destroem’ empregos

PIB de 2022: em torno de 4%

Eletrobras: venda é fundamental

Está feliz? Cargo é uma ‘missão’

Paulo Guedes sobre previsões da oposição e da mídia a respeito de Bolsonaro: “Houve 1 erro de avaliação brutal. Foi 1 problema de aprisionamento cognitivo. Chegou uma alternativa de liberais e conservadores ao poder e a esquerda declarou o fim do mundo”.Sérgio Lima/Poder360 – 14.jan.2020

PODER360
20.jan.2020 (segunda-feira) – 0h03

O ministro Paulo Guedes (Economia) declarou em entrevista ao Poder em Foco que o dólar alto e os juros baixos são “o novo normal” da economia brasileira. Para ele, o país saiu do abismo fiscal com a aprovação da reforma da Previdência, e deu espaço para inflação e taxa básica Selic menores.

Assista ao programa (53min59s):

“Essa combinação maldita de juros altos e câmbio baixo foi revertida. O Brasil, em vez de ser 1 país que tem 1 fiscal frouxo e apertado só no freio monetário, agora controla os gastos do governo, porque gasta muito e gasta mal. Nós queremos que o dinheiro fique no bolso do povo”, declarou Guedes.

As declarações foram dadas em entrevista ao jornalista Fernando Rodrigues, apresentador do programa Poder em Foco, uma parceria editorial do SBT com o jornal digital Poder360. A gravação foi realizada na última 3ª feira, dia 14 de janeiro de 2020.

Receba a newsletter do Poder360

Referência para balizar os juros no Brasil, a taxa básica Selic está no menor nível da história, aos 4,5% ao ano. O Copom (Comitê de Política Monetária), do Banco Central sinalizou que o percentual ainda pode cair ao longo de 2020, para 4,25% anuais, e retornar para o nível atual até o fim do ano.

Os juros estão baixos porque a inflação está controlada. O CMN (Conselho Monetário Nacional) estabeleceu uma meta de 4% para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) deste ano. Economistas entrevistados pelo BC estimam, porém, que o percentual ficará abaixo disso, em 3,58%. O Ministério da Economia projeta que a taxa terminará o ano em 3,62%.

O índice de preços se mantém em patamares controlados mesmo com a valorização do dólar frente ao real. A moeda norte-americana chegou à cotação de R$ 4,26 em novembro de 2019. A saída de dólares do Brasil somou US$ 44,7 bilhões em 2019, o que corresponde ao maior volume em 38 anos –e explica parte do encarecimento da divisa.

O ministro disse que o Brasil erra ao ter altos encargos trabalhistas que, para ele, são “armas de destruição em massa” de postos de trabalho. Guedes afirmou que o país tem cerca de 40 milhões “sem emprego com carteira assinada“, referindo-se à informalidade.

O governo federal publicou uma medida provisória criando o Programa Verde Amarelo, que busca inserir os mais jovens no mercado de trabalho. A proposta é reduzir obrigações trabalhistas do empregador e direitos dos empregados para fomentar a criação de mais vagas.

A MP encontrou resistência no Congresso. Deve ter difícil discussão entre os congressistas e a equipe econômica em 2020. Um dos trechos mais contestados é a taxação do seguro desemprego. A cobrança foi defendida pelo ministro, que compara quem recebe o benefício aos empregados com renda de 1 salário mínimo.“Se o sujeito trabalha, ganha R$ 1.000 e paga 1 impostozinho, por que se ele não trabalha e também ganha R$ 1.000, ele não vai pagar imposto?”, questionou Guedes.

O ministro também defendeu 3 reformas, o Pacto Federativo, a PEC dos Fundos e a PEC emergencial, encaminhadas ao Congresso em novembro de 2019. Os textos tramitam no Senado e estão sendo relatados por Márcio Bittar (MDB-AC)Otto Alencar (PSD-BA) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), respectivamente.

Na prática, as propostas dividem verba da União com Estados e municípios, liberam recursos retidos e criam mecanismos legais para segurar os gastos em momentos de maior pressão nos orçamentos. Guedes diz esperar que os temas avancem no Congresso, mesmo em ano eleitoral, porque as pautas teriam apelo para conseguir mais votos.

O ministro afirmou que as expectativas para o crescimento da economia brasileira podem ser “abaladas” em caso de descontinuidade das reformas. O Ministério da Economia projeta expansão de 2,4% do PIB em 2020. Com reformas, em 2022 o Brasil pode estar crescendo 4% ao ano, estima Guedes.Poder em Foco com Paulo Guedes 9 FotosVeja a galeria completa›

O ministro também listou a reforma administrativa como projeto importante para o início deste ano, dizendo que pode ajudar os políticos a obter votos nas disputas das eleições municipais.

Ao tratar das privatizações, o ministro afirmou que é preciso desestatizar “as maiores” empresas para ter 1 efeito fiscal maior. O governo tem uma meta de arrecadar R$ 150 bilhões com privatizações e desinvestimentos neste ano.

O chefe da equipe econômica acha que, se a Eletrobras não for vendida em 2020, será preciso remanejar recursos do Orçamento da União, sobrando menos dinheiro para investimentos em educação e saúde. É preciso tomar uma decisão nos próximos 2 ou 3 meses, diz. Acrescenta que é necessário empenho conjunto dos presidentes do Senado e Câmara, Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia, e da República, Jair Bolsonaro.

O ministro não demonstrou ter restrições à presença de estatais estrangeiras em leilões de empresas públicas brasileiras. Para ele, não há problema, por exemplo, uma estatal chinesa adquirir a CEB (Companhia Energética de Brasília), que fornece energia elétrica para a capital do país e, consequentemente, para o Palácio do Planalto.

“Não há nenhum preconceito com a estatal daqui ou de lá (…) Se vier empresa americana, chinesa, japonesa e fornecer o saneamento, educação, ou a energia elétrica que Brasília precisa, isso que interessa”.

A equipe econômica também deve adotar medidas para simplificar a atuação de empresas que vendem produtos ou serviços para fora do país, a exemplo do que outros países têm feito no comércio digital. O desafio para isso, indica o chefe do Ministério da Economia, é mudar a cultura corporativista de órgãos do governo, dentre eles, a Receita Federal: parar de exigir que 1 estrangeiro em outro país tenha CPF para comprar 1 livro ou algum outro produto de sites brasileiros.

“A Receita Federal pergunta para 1 chinês: cadê seu CPF? Chinês não tem CPF. Isso é 1 exemplo de uma barreira burocrática idiota, que prejudica os brasileiros. Os brasileiros compram tudo lá fora e eles não podem comprar aqui dentro. É 1 exemplo do que nós chamamos da captura por interesses corporativos”.

Sobre a reforma tributária, disse que o governo vai encaminhar as propostas na comissão especial mista que acompanha o tema. Os congressistas devem fundir com outras duas PECs que tramitam, uma no Senado e a outra na Câmara.

Para Guedes, é preciso criar 1 base ampla de tributação para conseguir diminuir os impostos sobre encargos trabalhistas. Está em estudo 1 imposto sobre transações. O ministro diz não se tratar de nova versão da antiga CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), que enfrenta resistência no Congresso e na sociedade.

Ele prometeu promover uma simplificação e redução de impostos, além da tributação de dividendos.

Guedes também disse que, ao contrário do noticiado pela mídia no início do mandato do presidente Jair Bolsonaro, a democracia não esteve em risco. De acordo com ele, a imprensa não percebeu o surgimento de uma “aliança política entre conservadores e liberais”, formada pelas redes sociais, e se equivocou ao transmitir para o exterior uma imagem “injusta” da democracia brasileira.

“Nunca houve esse risco na minha opinião. Houve 1 erro de avaliação brutal ou 1 problema de aprisionamento cognitivo. A esquerda estava tão bem instalada no poder que, quando chegou uma alternativa de liberais e conservadores, declarou o fim do mundo”, disse.

LEIA TRECHOS DA ENTREVISTA

A seguir, trechos da entrevista do com Paulo Guedes, gravada em 14 de janeiro de 2020 (o que está em “itálico” é fala do ministro):

DEMOCRACIA E DAVOS

O senhor vai começar a semana em Davos, na Suíça. O que é necessário dizer sobre o Brasil para o público externo?
Paulo Guedes – Confirmaremos as previsões que fizemos quando fomos lá há 1 ano. Quando começou o governo, havia, como efeito da disputa eleitoral, uma percepção muito equivocada a respeito do que estava acontecendo. Falava-se em risco à democracia e ao sistema econômico. Àquela ocasião, disse o contrário. O Brasil é uma democracia vibrante e que estava se ampliando, dando uma demonstração extraordinária de vigor.
Depois de 30 anos de hegemonia de sociais-democratas –natural depois do regime militar– havia uma aliança política entre conservadores e liberais que enriquecia o espectro político. A própria mídia, que estava encantada pelo 
establishment e não percebeu o surgimento dessa presença popular das redes sociais, acabou se equivocando. Transmitiu lá para fora a imagem completamente injusta da democracia brasileira.

A revista The Economist, que é liberal, inglesa, diz que a economia brasileira vai bem, mas que há muito retrocesso em valores democráticos. Essa narrativa tem sido majoritária. Por quê?
Os danos foram muito grandes. Nós mesmo não soubemos valorizar o vigor, a força e o aperfeiçoamento de nossas instituições.
O Legislativo declarou sua independência quando fez 1 impeachment à direita, com o (Fernando) Collor, e outro à esquerda com a Dilma (Rousseff). Depois o Judiciário despertou e prendeu o político mais popular do Brasil, exatamente por suposta compra de apoio parlamentar.

O senhor acha que está totalmente afastado qualquer tipo de retrocesso democrático?
Nunca houve esse risco.
Houve 1 erro de avaliação brutal ou 1 problema de aprisionamento cognitivo. A esquerda estava tão bem instalada no poder que, quando chegou uma alternativa de liberais e conservadores, declarou o fim do mundo.

O presidente não estará nesta semana na Suíça, onde haverá o encontro econômico em Davos. Vai fazer falta?
Sempre que o presidente entrega a sua mensagem, a imagem do país é fortalecida. O presidente está sendo muito exigido. Ele tem uma viagem logo depois para a Índia. Acabou de fazer viagem para a China. Eu, por exemplo, não pude ir à China com ele. Todos os ministros estão se alternando.

DÓLAR E JUROS

Hoje o dólar está 1 pouco acima de R$ 4. A moeda se acomodou nesse patamar e vai seguir assim?
Os últimos 30 anos foram de descontrole de gastos, [controle] fiscal frouxo e pé no freio monetário.
Quando se gasta muito e aperta só no Banco Central, os juros vão para cima.
O Brasil durante 10, 20 ou 30 anos teve juros muito altos e câmbio muito baixo. Isso desindustrializou o Brasil, trouxe excesso de importações, prejudicou as exportações e atravancou os investimentos. Essa combinação maldita de juros altos e câmbio baixo foi revertida.
O Brasil, em vez de ser 1 país que tem fiscal frouxo e apertado só no freio monetário, agora controla os gastos do governo, porque gasta muito e gasta mal. Nós queremos que o dinheiro fique no bolso do povo.

Isso é uma espécie de “novo normal” daqui pra frente?
É 1 novo normal. Não quer dizer que o câmbio vai ficar a R$ 4. A nossa ida lá para fora é para dizer para o mundo: olha, ano passado saímos do abismo fiscal, este ano vamos aprofundar as reformas. O Brasil vai acelerar o crescimento, aumentar o ritmo de criação de empregos, investimentos e, naturalmente, os recursos virão de fora. Pode até ser que o dólar desça 1 pouco novamente.

CRESCIMENTO E INFLAÇÃO

O Ministério da Economia divulgou projeções macroeconômicas. O crescimento da economia em 2020 será de 2,4% e a inflação oficial será de 3,62%. Essas projeções podem ser garantidas mesmo que o Congresso acabe não aprovando todas as reformas que estão lá?
Fazemos projeções condicionadas às hipóteses. Estamos otimistas, acreditando na manutenção do ritmo das reformas e isso garante que o crescimento venha de 1 pouco mais de 1% (2019) para o dobro, 2,4%, e que a inflação continue sobre controle.
O Pacto Federativo, o estado de emergência fiscal e o controle de gastos públicos vão prosseguir 
[no Congresso]. A reforma administrativa também vem aí.
Essas expectativas podem realmente virar adversas sem as reformas. E vale para os dois lados. Podemos projetar para o ano seguinte (2021) 3,5% de crescimento, com inflação e juros baixos, porque as reformas prosseguiram.

No final da administração Jair Bolsonaro o Brasil vai estar rodando num crescimento de quanto?
Podemos estar acima de 3%, ou em torno de 4%. Depende do ritmo das reformas. Se nós aprofundarmos as reformas, o Brasil vai acelerar o crescimento.

E a inflação, que pune os mais pobres? Houve uma disparada em dezembro por causa da carne e petróleo. Neste ano, a meta é de 4%. O senhor acha que vai ser possível seguir a meta?
Está na meta. O importante é que o fenômeno inflacionário está equacionado no Brasil. Depois de décadas de combate, o Brasil acabou entendendo como combater a inflação e sabendo que o coração desse combate de 1 lado é o Banco Central, e, de outro, a dimensão fiscal.
Como não controlavam os gastos públicos, esse combate à inflação custou muito ao Brasil. Juros excessivamente elevados e aumento de impostos. Acabou atravancando, diminuiu a dinâmica de crescimento do Brasil.

DESEMPREGO E ENCARGOS TRABALHISTAS

A taxa de desemprego segue alta, apesar de ter havido alguma recuperação em 2019. O que o senhor diria para as pessoas que estão procurando emprego este ano?
O desemprego é dramático e tem proporções colossais. As pessoas dizem que têm entre 12 milhões, 13 milhões [de desocupados]. Mas, se olharmos bem, nas últimas duas, três décadas, o Brasil tem quase 40 milhões de brasileiros sem emprego com carteira assinada. Muita gente na informalidade e no desalento.
O Brasil usou, equivocadamente, encargos trabalhistas excessivos. Para financiar sua Previdência, colocou impostos altos sobre a mão-de-obra. Se você quiser empregar alguém por R$ 1.000, custa R$ 2.000. Para criar emprego, desemprega outro brasileiro.

Houve recentemente uma medida proposta pelo governo que é o Programa Verde Amarelo. Houve uma reação contrária forte do Congresso. Tem como melhorar e aprovar esse programa?
A versão mais potente que criaria milhões de empregos, em 2 ou 3 anos, seria a capitalização da Previdência com a desoneração completa para os jovens.
A carteira verde e amarela era a criação de 1 novo regime trabalhista previdenciário, onde os jovens teriam escolha. Você pode querer entrar no regime antigo –esse no qual você tem os encargos trabalhistas, tem sua aposentadoria, tem sindicatos, todas essas medidas que estão aí, que na minha visão são obsoletas, antiquadas. Esses encargos trabalhistas são armas de destruição em massa de emprego. Milhões de brasileiros são impedidos de trabalhar.

E esse outro regime que o senhor disse?
Uma vez frustrada a reforma da carteira verde e amarela com capitalização, Rogério Marinho [Secretário de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia] está tentando atacar o problema do desemprego com alguns elementos daquela proposta original, que era a mais potente. Aquela nós estamos falando de 5, 6, 8 milhões de empregos num período de 4 anos.

Está abandonada, por enquanto?
O Congresso aprovou uma reforma da Previdência com potência fiscal suficiente para deixar esse governo tranquilo e mais uns 2 ou 3 governos aí pra frente, mas não com o desenho que permitisse a absorção de milhões de novos empregos.

O que fazer pra resolver essa má reação do Congresso?
Houve muito mal-entendido. Sobretudo por conta da taxação do desempregado. Essa proposta na verdade foi do governo do PT lá trás, que disse: para garantir o acesso à Previdência, vamos botar 1 impostozinho sobre o seguro desemprego, não é? Na verdade, se o sujeito trabalha, ganha R$ 1.000 e paga 1 impostozinho, por que se ele não trabalha e também ganha R$ 1.000 [de seguro desemprego] não vai pagar imposto?

Dá pra recuperar?
É 1 problema político. Eu não sou bom em política. O presidente diz sempre que eu não entendo nada de política e eu acredito nele.