Faço parte do povo que prefere comida simples, do que comida cara e chique

Faz parte de minha profissão visitar bares e restaurantes, o que, na maior parte das vezes, é um grande barato. Uma das minhas diversões é transformar pratos caros em uma comida de acesso ao grande público, usando ingredientes sazonais.

Adoro os rangões do mundo inteiro, e sempre busco sabor nos pratos clássicos. Se vou a uma pizzaria, peço uma margherita, em um francês, um cassoulet, em uma hamburgueria, um cheese-salada, e por aí vai. Acho que, se um restaurante não sabe executar o básico, não vale a pena experimentar o resto.

Além disso, dificilmente a receita contemporânea me agradará mais que a clássica. Não se pode virar as costas para séculos de tradição. Uma coisa é o Rodrigo, do Mocotó, usar defumador para fazer torresmo, e carne de sol em baixa temperatura. Isso é usar técnica em favor do ingrediente, e com intimidade com o mesmo.

Agora, fico bastante irritado com chefs que, para aparecer, usam técnica pela técnica, de maneira gratuita, e se aproveitam da falta de parâmetro da clientela para cobrar um preço estratosférico por um prato que parece uma instalação.

Não sou rato de laboratório à disposição para eventuais testes de estudantes de gastronomia recém-formados que não têm nada a dizer. Difícil respeitar quem não manuseia direito uma frigideira, mas faz acrobacias com um sifão.

O que te faz mais feliz? A textura de um cogumelo ou a espuma dele? Devemos respeitar os ingredientes! Ou, uma hora, eles se revoltarão contra nós.

Será que esse povo sabe fazer uma galinha? Por que uma galinha mal feita é uma galinha morta à toa. Não gostaríamos de ver isso.

É cada vez mais difícil encontrar um belo e simples prato de comida. Fomos criados na base de arroz, feijão e bife. Porque não encontramos isso nos melhores restaurantes? Duas ou três exceções servem isso de maneira bacana. É muito pouco.

Adoro comida italiana, japonesa e francesa. Mas não entendo por que temos centenas de restaurantes de outras culturas e uns três ou quatro brasileiros.

Estamos esquecendo o básico. Nossas raízes. Para cozinhar bem, é preciso ter intimidade com o ingrediente e com a receita. Dificilmente encontramos um francês bacana sem um cozinheiro francês, e por aí vai.

Agora, quando você não tem intimidade com nada, e passa a fazer cozinha de autor, entra em território perigoso. Tem que ter base, pois sem isso não se chega a lugar nenhum. Simples assim. Cozinheiro sem base não tem nada a dizer.

Dou dois exemplos. Um bom e outro ruim. O bom: Raphael Despirite. Junto com sua jovialidade e excelente formação, carrega mais de 50 anos de tradição francesa na família e, a partir daí, desenvolve uma cozinha de autor leve, inteligente e concisa. Une técnica com tradição, de maneira harmoniosa e, como ainda é um jovem, deve chegar bem além do que já pratica. Está em bom caminho. Exemplo ruim: Leonardo Botto, do La Frontera. Estive lá e pedi um ceviche terrível, típico de quem não tem a menor idéia do que faz. E de sobremesa, pudim talhado, a 14 reais! Uma pena!

E o pior é que esses restaurantes “contemporâneos” cobram mais que franceses 3 estrelas michelin. Nada justifica isso!

Cada vez mais, indico restaurantes de natureza simples, tocados por famílias, e que não cobrem um preço exorbitante. Seja japonês, francês ou brasileiro.

Não percamos o foco. Nada me deixa mais feliz que um bom e velho prato de comida.

“Eu quero é feijão com arroz”