Moradores dizem que PMs que mataram 13 no Fallet teriam agido em conluio com facção

Por Mario Hugo Monken eurio.com.br/

Foto: Reprodução de TVMoradores dos morros do Fallet e do Fogueteiro, no Catumbi, na Região Central do Rio, disseram que PMs que participaram de uma operação em fevereiro nas comunidades, que resultou em 13 mortes, teriam agido em conluio com uma facção criminosa que disputava o controle do vizinho Morro da Coroa. Segundo eles, traficantes deste grupo foram vistos dentro do veículo blindado da corporação, conhecido como “Caveirão”.  
A informação consta em um relatório produzido pela Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB/RJ sobre o caso. Na época do fato, havia uma guerra entre o Comando Vermelho (CV) e o Terceiro Comando Puro (TCP) sendo que uma testemunha, que perdeu um filho e um sobrinho na ação, citou o nome do traficante Empada (Leonardo Miranda da Silva), líder do TCP na região, como participante deste suposto acerto com policiais.
Essa testemunha disse que foi ameaçada devido ao fato de ter aparecido nos noticiários e por ter percorrido instituições para denunciar supostas irregularidades cometidas pelos PMs na ação. Ela teme pela sua integridade física, dos seus filhos menores e também de moradores. 
“Todos vão morrer”, teria dito um policial 
Ela contou em depoimento que no dia do fato os policiais militares foram até uma casa na Rua Eliseu Visconde sob alegação de que estariam no local traficantes de drogas. Cita em seu relato que os agentes executaram as vítimas  diferentemente do que foi alegado na versão oficial de que houve troca de tiros. “Um dos policiais, que não estava com o rosto tapado, gritou que todos iam morrer”, conta. 
“Meu filho gritou por mim antes de morrer”
“Uma senhora que mora na casa de frente viu tudo acontecer. Ela me disse que meu filho caminhou até a frente da casa e gritou para os policiais que eles se rendiam. Mas neste espaço de tempo, outro policial pulou o muro por trás, entrou na casa e começaram os tiros, a torturar e matar quem estava dentro. Estava senhora ainda ouviu o meu filho pedir ajuda e gritar por mim, informou o relato da testemunha à OAB/RJ. 
No mesmo depoimento, essa pessoa disse que os policiais removeram os corpos dos mortos sem que fosse feita a perícia.
Ela contou  que os familiares tentaram chegar perto do local para evitar que seus filhos e parentes fosse mortos mas os policiais não teriam deixado, dispersando todos com disparos de armas de fogo. 
“Da próxima vez, vamos matar 20”
Falou que seu filho mais novo, de nove anos, também teria sido ameaçado de morte por um policial que teria falado para o garoto: “cresce que eu faço contigo também”. Comentou ainda que os policiais teriam dito após as mortes: “Da próxima vez, vamos matar vinte”
Para ela, o filho morto, que tinha 21 anos, foi torturado e assassinado com objeto perfuro contundente  e não de tiro e teve o crânio e membros do corpo fraturados.  “Meu filho foi torturado, meu filho teve a cabeça amassada. Não houve troca de tiro”. 
O medo é geral 
A OAB/RJ encaminhou esse relatório ao Ministério Público Estadual, Defensorias Públicas Estadual e da União e Ministério Público  Federal e citou os nomes de 14 PMs que participaram da operação. Os agentes receberam homenagens da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). 
Na última sexta-feira (12), o Circuito Favelas por Direitos na Defensoria Pública Estadual voltou ao local para fazer uma escuta qualificada de como têm sido as ações policiais no período e para prestar informações para as famílias das vítimas. Com início do Circuito no morro do Fogueteiro, moradores relataram que o número de operações aumentou este ano, principalmente na hora de entrada e saída das escolas e creches, que uso de helicópteros, inclusive como plataforma de tiro, também tem se intensificado, assim como a ocupação ilegal de casas de moradores em pontos considerados estratégicos para as ações policiais. 
No Fallet, o ouvidor externo da Defensoria Pública do Rio (DPRJ), Pedro Strozenberg, e a defensora do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh) que acompanha o caso, Lívia Casseres, informaram que é muito preocupante a destruição de provas neste caso, mas que continuam acompanhando as investigações e solicitando uma maior participação do Ministério Público no caso, alegando que a Polícia Civil não forneceu o acesso solicitado pela instituição às fotografias dos cadáveres que acompanham os laudos médico-legais, nem ao inquérito policial.


De acordo com uma moradora, a resposta desta investigação vai ser uma conquista para a comunidade que vive com medo:

“Essa cultura do medo precisa acabar. As pessoas precisam entender que o estado não é inimigo, que a comunidade não pode ser tratada como lixo tendo a certeza da impunidade. Não queremos acreditar que estamos em um navio negreiro”, disse

PM responde 

Procurada, a assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que a operação deflagrada na madrugada de  8 de fevereiro  nas comunidades Coroa e Fallet foi planejada para intervir numa guerra entre facções criminosas rivais, que disputam o controle de território naquela região, tendo como principal preocupação a preservação de vidas. Com base em informações das áreas de inteligência, o Comando de Operações Especiais (COE) mobilizou suas unidades especializadas.
Durante a operação, as equipes foram direcionadas por uma ligação do Disque Denúncia a uma residência no interior da comunidade. Com a aproximação dos policiais, criminosos fortemente armados atiraram de dentro de uma casa e foi iniciado um confronto. Após a estabilização do incidente, 11 criminosos que tentavam escapar do local foram presos em ação de cerco na região. Outros 15 bandidos foram encontrados feridos e socorridos para o Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro. Destes socorridos, 13 vieram a óbito e dois permaneceram internados. Durante a operação os policiais apreenderam quatro fuzis, 14 pistolas, seis granadas, três radiocomunicadores, além de carregadores e drogas.
Vale ressaltar que a Secretaria de Estado de Polícia Militar instaurou Inquérito Policial Militar (IPM), medida adotada sempre que uma operação resulta em lesão corporal ou morte. Também como parte do protocolo interno da Corporação, a Corregedoria da Polícia Militar disponibiliza canais de comunicação para eventuais denúncias, sempre preservando a identidade do denunciante. Além disso, a ação foi registrada na Delegacia de Homicídios da Secretaria de Polícia Civil, que é a instância responsável pelas investigações.
A Polícia Civil também foi questionada sobre o fato mas até o fim da tarde não havia respondido a reportagem.