“O ofício de enxugar gelo”

Mesmo com apreensões volumosas de cocaína e maconha, realizadas por bons policiais, os traficantes mantêm a oferta de entorpecentes quase intacta.

O combate ao tráfico de drogas no Brasil é, certamente, um dos ofícios mais utópicos existentes em todo o território nacional. Bravos, incansáveis, obstinados e competentes são os policiais, sobretudo os que atuam na interceptação de volumosos carregamentos de entorpecentes, como maconha e cocaína.

Lutar contra o tráfico no País é algo como enxugar gelo para estes servidores (policiais, investigadores, agentes públicos) mais dedicados. Apreensões que chamam a atenção por seu alto volume, depois de pesadas e encaminhadas para a destruição são uma agulha em um palheiro. Grosso modo, seria como utilizar uma raquete de matar mosquito para conter uma nuvem de insetos.

Na edição de ontem noticiamos mais uma grande retenção de carregamentos de droga que teve origem em Mato Grosso do Sul. Perto da cidade de Marabá Paulista (SP), caminhoneiro que morava em Campo Grande, e transportava uma carga de milho, foi preso depois que os policiais rodoviários do estado vizinho encontraram 125 quilos de cocaína em meio ao cereal. Na Rodovia Raposo Tavares, perto da cidade de Presidente Venceslau (SP), ocorreu caso semelhante. Caminhoneiro de Ponta Porã levava 206 quilos de cocaína dentro da carroceria.

Estas duas apreensões recentes demonstram um fato positivo e um negativo. O lado bom é que há policiais que cumprem seu dever, sejam eles da Polícia Rodoviária Federal, dos batalhões rodoviários das polícias militares de Mato Grosso do Sul e dos estados vizinhos (no caso citado acima, de São Paulo), e mesmo do Departamento de Operações de Fronteira (DOF). São estas forças as que mais contribuem para o impressionante volume de entorpecentes interceptados nas estradas brasileiras. A parte ruim da história é que nas bocas de fumo do País ainda há muita droga para vender. A oferta, mesmo com estas grandes apreensões, ainda dá conta de suprir a demanda.

A fronteira brasileira com países produtores ou distribuidores de drogas, como Paraguai e Bolívia, não está aberta aos traficantes. Está escancarada. A fiscalização na fronteira é quase inexistente, porque o poder público não se faz presente a ela. São inúmeras as pequenas cidades nesta faixa territorial onde não há um servidor federal (de qualquer área) sequer.

O mais triste de se constatar é que não há perspectivas de que a ação dos traficantes será dificultada. Estas apreensões que consideramos grandes já estavam previstas na contabilidade de muitos deles. Eles continuarão enviando drogas para os centros consumidores, cada vez mais facilmente, pois a Polícia Rodoviária Federal tem um efetivo cada vez menor, aparelhos de scanner estão encaixotados, e promessas de melhorar a infraestrutura das forças de segurança nesta faixa territorial jamais foram cumpridas. correiodoestado