O presidente pode nomear seu filho como embaixador?

 Para responder a essa pergunta são necessárias algumas considerações. 

A primeira delas diz respeito à função de Embaixador. O embaixador é a mais alta representação diplomática do país no estrangeiro, encarregado de representá-lo politicamente para finalidades de interesse público. No Brasil, a carreira diplomática decorre de aprovação em concurso público, de competência do Instituto Rio Branco, que seleciona e capacita aqueles que exercerão as funções de diplomatas e cônsules. 

Em regra, o Presidente da República deve indicar como embaixador um servidor da carreira diplomática. Contudo, como a função de Embaixador é de natureza política, pode o Presidente da República nomear uma pessoa que não pertença aos quadros do serviço exterior brasileiro de forma excepcional, desde que seja brasileiro nato, tenha mais de 35 anos e tenha prestado “relevantes serviços ao país”. Esta previsão está contida no art. 41, parágrafo único, da Lei 11.440/2006:

Art. 41. Os Chefes de Missão Diplomática Permanente serão escolhidos dentre os Ministros de Primeira Classe ou, nos termos do art. 46 desta Lei, dentre os Ministros de Segunda Classe.

Excepcionalmente, poderá ser designado para exercer a função de Chefe de Missão Diplomática Permanente brasileiro nato, não pertencente aos quadros do Ministério das Relações Exteriores, maior de 35 (trinta e cinco) anos, de reconhecido mérito e com relevantes serviços prestados ao País.

Desse modo, a indicação de pessoa estranha ao serviço diplomático brasileiro constitui uma exceção, pois a regra exige um servidor de carreira, concluindo-se que o Presidente da República pode nomear seu filho se atendidas as exigências da lei. 

A segunda análise se refere à configuração de nepotismo, conduta que representa a nomeação ilegal de familiares para exercer cargos públicos. O nepotismo está previsto na Súmula Vinculante n. 13 do Supremo Tribunal Federal, que assim diz:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Todavia, o próprio Supremo Tribunal Federal limitou a aplicabilidade da Súmula Vinculante n. 13, de modo que esta não se aplica a cargos de natureza política, como Ministros de Estado e Secretários estaduais e municipais. Como a função de Embaixador é de natureza política, a nomeação do filho para esse cargo não significa a prática de nepotismo.

Assim, sob o prisma estritamente legal, a nomeação de um filho para exercer a função de Embaixador não configura ilegalidade. Cabe ressaltar que a análise desta nomeação ainda pode ser questionada sob o aspecto da moralidade, princípio previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, que exige do gestor público, uma conduta compatível com a ética e a boa-fé.

Resta ainda aguardar a resposta dos Estados Unidos da América quanto ao aceite de eventual indicação do filho do Presidente da República, pois, dentre as prerrogativas da soberania do Estado, está a possibilidade de recusar o representante do outro, declarando-o “persona non grata”, que significa a recusa do país que irá receber o representante diplomático, que pode o considerar uma pessoa que não é “bem-vinda”, nos termos do art. 9º da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961.

Em todo o caso, a função de chefe da missão diplomática da República Federativa do Brasil perante os Estados Unidos da América (cujo primeiro a ocupá-la foi Joaquim Nabuco) é de fundamental importância para as relações internacionais brasileiras, de modo que o Embaixador deva ser nomeado em virtude de sua capacidade diplomática de representar o país e não para o atendimento de finalidades pessoais. 

Referências

ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Públi-co. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

MACHADO, Fernando. Direito internacional e Direitos humanos. 3. ed. rev. atual. e ampl. Bauru: Spessoto, 2019.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de internacional públi-co. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribu-nais, 2016.

Fernando Machado

Doutor em Direito e Professor de Direito Internacional da Unigran