Denúncia revela como quadrilha traficava armas e munições dos EUA para o Brasil

Material vinha em meio à cargas lícitas para transportá-las da América

Por Mario Hugo Monken em 09/12/2018 às 10:51:27

Denúncia do Ministério Público Federal revela como a quadrilha do empresário Frederik Barbieri, responsável pelo carregamento de 60 fuzis que foram apreendidos no Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim, na Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio de Janeiro em 1º de junho do ano passado, dentro de bombas e aquecedores de piscinas, transportava as armas desde os Estados Unidos até o Brasil.
Frederik Barbieri foi preso no dia 24 de fevereiro no Estado da Flórida, nos Estados Unidos. Na ocasião foi apreendida com ele mais uma carga de aproximadamente 40 fuzis que seriam novamente enviados ao Brasil.
O Ministério Público Federal denunciou ao todo 16 pessoas da quadrilha de Barbieri. Em setembro, a Justiça Federal condenou dez integrantes do bando com penas que variavam entre 13 a 27 anos de prisão. Barbieri havia sido condenado em julho pela Justiça norte-americana a 12 anos e oito meses de prisão por tráfico internacional de armas. O governo brasileiro pediu a sua extradição.
Segundo as investigações, o grupo adquirira, em Miami e em cidades próximas, aquecedores de piscina e bombas d’água, que eram transportados até a residência de Barbieri. Em seguida, os denunciados desparafusaram os produtos e os cortaram com uma maquita, retirando-lhe a estrutura de metal interna, a fim de aproveitar apenas a carcaça oca dos produtos para a empreitada criminosa.
Após o desmanche, a unidade dos produtos, que, normalmente, pesa cerca de 60 kg, passou ostentar de 15 kg a 20 g, viabilizando o abastecimento do seu interior com as armas de fogo, acessórios e munições de uso restrito para posterior exportação para o Brasil.
Retirada a estrutura metálica interna, os suspeitos transportaram os produtos para o outro imóvel em Miami, também de propriedade de Barbieri. Uma vez entregues no segundo imóvel, eles abasteceram cuidadosamente as carcaças ocas dos aquecedores de piscina com fuzis e carregadores e as bombas d´água com munições assim como fecharam acuradamente os aludidos produtos.
O procedimento incluía a pesagem de cada aquecedor e cada bomba, de modo a assegurar que, quando devidamente fechados, os produtos ostentassem o mesmo peso, e não chamassem a atenção da fiscalização.
Após fechar meticulosamente as carcaças dos aquecedores e bombas d’água, os produtos eram embalados em plásticos pretos, deixando-os prontos para a exportação. Na sequência, parte dos denunciados transportaram as cargas para um galpão, onde era realizados os preparos finais para exportação. Esses preparos consistiam, em suma, em acondicionar as cargas em pallets (encaixes de madeira) e as encaminhar, posteriormente, ao Aeroporto Internacional de Miami.
Há fortes indícios de que, nessa fase da empreitada criminosa, a fim de viabilizar a importação para o Brasil sem que a fiscalização detectasse o verdadeiro conteúdo das cargas importadas, a quadrilha falsificava documentos em nome de duas empresas  para dar aparência de regularidade à importação das cargas. Já no Brasil, eram usados os nomes de mais quatro firmas. As cargas, no entanto, em vez de serem entregues na sede das empresas que figuravam como importadoras ou algum seu representante eram, na verdade, levadas para o Centro da cidade de Niterói para onde seguiam finalmente para a venda clandestina no mercado interno.
Segundo a denúncia, entre os anos de 2014 e 2017, a quadrilha exportou e importou por 75 vezes, armas de fogo (pelo menos 1043), acessórios (pelo menos 1043 carregadores) e munições de uso restrito (pelo menos 297 mil unidades), sem autorização da autoridade responsável (Comando do Exército), escondidos no interior da carcaça de aquecedores de piscinas e de bombas d’água, transportados em cargas aéreas provenientes de Miami e chegadas ao Brasil no Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim.
O documento da Procuradoria detalha mais a estratégia. Em cada unidade de bomba d’água remetida para o Brasil, havia cerca de 450 munições para fuzis.
Assim, tendo em vista que, entre os anos de 2014 e 2017, as exportações/importações eram de 20 unidades por carga, conclui-se que o bando internalizava cerca de 9 mil munições em cada carga de bomba d’água. Levando-se em consideração que foram 33 importações de bombas, conclui-se a organização criminosa importou 297 mil de munições de fuzis.
Quanto aos aquecedores e tomando-se por base apreensão realizada no Aeroporto do Galeão, cada carcaça era recheada com sete ou oito fuzis. Considerando que foram encaminhados 149 aquecedores, conclui-se que foram importados entre 1043 a 1192 fuzis. Como cada fuzil chegava com pelo menos um carregador, valem esses mesmos números para este acessório.
A organização criminosa adquiria os fuzis por valores em torno de US$ 2.500,00 a US$ 3.500,00. Cada remessa de aquecedores rendia entre R$ 1,3 milhão e 1,5 milhão. A conclusão é que cada artefato era vendido no Brasil por valores entre R$ 37.500,00 e R$ 53 mil.
No Brasil, as armas, munições e acessórios eram vendidas a integrantes das facções criminosas (Comando Vermelho, Amigos dos Amigos, Terceiro Comando Puro) que dominam as comunidades da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Em uma escuta telefônica feita no dia 13/8/2015, um dos denunciados diz a um traficante que um fuzil AR-15 custaria R$ 45 mil.
Nas negociações, a quadrilha usava expressões para designar o material: fuzil era chamado de flecha, munição era jujuba, pente ou biscoito eram carregadores.
Entre os traficantes fluminenses que teriam negociado armas com o bando estavam Falcão do Anaia, em São Gonçalo e Ben 10, do Morro do Engenho da Rainha, na Zona Norte do Rio, ambos ligados ao Comando Vermelho. Eurio.com.br