ALERTA. Se população não colaborar, MS terá colapso na saúde e lockdown neste mês

O crescente e súbito aumento do número de casos e mortes de Covid-19 ocorridos nos últimos dias em Mato Grosso do Sul tem causado preocupação, principalmente quanto a taxa de ocupação dos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), tanto na rede pública quanto na privada, que podem levar ao colapso no sistema de saúde. Para evitar que a situação chegue a esse ponto extremo, Ministério Públicos Estadual, Federal e do Trabalho de Mato Grosso do Sul, elaboraram nota conjunta e pediram, em vídeo, que a população colabore, cumprindo todos os decretos elaborados até então para conter o contágio e achatar a curva de contaminação, especialmente no que diz respeito ao uso de máscaras e distanciamento social.

Boletim divulgado hoje (1º) pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) aponta 711 novos casos confirmados e nove mortes por Covid-19 ocorridas no Estado nas últimas 24 horas. Os números recordes demonstram que o contágio está acontecendo de forma acelerada, ao mesmo passo em que os índices de isolamento social estão despencando, com taxa média de 38,5% em junho, muito abaixo do mínimo considerado aceitável, que é de 60%.

“O sistema público e privado de saúde local não tem condições de enfrentar surto elevado de COVID-19, havendo, caso a disseminação continue nos moldes atuais, risco de insuficiência de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para atender pacientes graves, não somente do novo coronavírus, mas também os acometidos de outras tantas sérias doenças que igualmente necessitam de UTI”, diz a nota conjunta. 

Conforme o Procurador da República do Ministério Público Federal, Pedro Gabriel Siqueira Gonçalves, responsável pela área de saúde em Campo Grande, população deve se conscientizar que a falta de leitos não será apenas para pacientes com coronavírus, mas para quem, por ventura sofra acidente de trânsito ou tenha outros problemas graves, como enfarto ou AVC, por exemplo.

“O momento que vivemos é de incerteza. Os gestores são desafiados a proteger um bem tão caro como a saúde pública, não tem medicamento, não tem vacina. A única certeza cientifica nesse contexto, é que o isolamento e distanciamento social freiam o contágio e todas as consequências disso. As medidas restritivas no começo da pandemia surtiram efeito, mas recentemente houve aumento de contágio. É um dado matemático, se o contágio aumenta em escalada geométrica, a consequência imediata é a falta de leitos. A população faz parte da resolução do problema, não pode achar que é um problema que tem que ser resolvido só pelo gestor público, tem que respeitar. Se sensibilize com a morte de um estranho, não precisa chegar em alguém próximo para se sensibilizar”, disse Gonçalves, fazendo um apelo a população. 

A nota foi elaborada porque, analisando o que aconteceu em outros estados, se a curva de casos continuar crescente, o colapso deve ocorrer no fim de julho e início de agosto. 

Além do desrespeito de grande parte da população às medidas adotadas, outro fator que contribuem para o pico de casos é o clima e circulação de vírus respiratórios, que ocorre durante o inverno no Centro-Oeste. 

APELO PARA EVITAR COLAPSO NA SAÚDE

Promotora de Justiça de Defesa da Saúde Pública, Filomena Aparecida Depólito Fluminhan, diz que as medidas que cabem aos poderes públicos foram determinadas, inclusive acatando recomendações do Ministério Público Estadual (MPMS), e que o cabe agora é a colaboração da população.

“É um desafio, um momento de grande dificuldade da saúde pública e que exige de todos nós um comprometimento acima de tudo social para que possamos vencer a batalha contra o coronavírus. É sabido que nos últimos dias os números tem aumentado de modo alarmante. Por esse motivo viemos a público para convocar a população para que faça medidas necessárias de uso de máscara e distanciamento social. Só com adesão a população teremos vitória contra o corona”, pediu.

Entre os decretos publicados pelas prefeituras e municípios, estão, além do uso obrigatório de máscaras de proteção facial, o toque de recolher, medidas de biossegurança para estabelecimentos comerciais, que devem atender com um limite da capacidade, distanciamento de clientes ou mesas, no caso de bares e restaurantes, entre outras. Aulas presenciais e atividades como festas estão suspensas. 

No início da pandemia, ainda na primeira quinzena de março, prefeitura de Campo Grande decretou medidas mais restritas, com fechamento de todas as atividades econômicas que não são consideradas essenciais, o que surtiu efeito, segundo Filomena. Com os indicadores de contágio e ocupação de leitos baixos, iniciou-se, gradualmente, a flexibilização.

A promotora explica que, além das medidas restritivas iniciais, o contágio também foi baixo na Capital devido à situação epidemiológica local, que no sudeste e norte, onde houve pico de casos primeiro, a circulação de vírus respiratórios começa antes, enquanto no Centro-Oeste é em meados de maio, junho e julho, aliado ao frio de inverno, que resulta em aumento de Síndromes Agudas Respiratórias (Sars). Por isso, o isolamento social é ainda mais indicado pelas autoridades de saúde, para evitar que os vírus tenham maior circulação.

“A população não está fazendo a sua parte. Precisa aderir essas medidas porque temos estudo da UFMS, realizado final de abril, que previa em maio aumento grande de casos com restrição das medidas iniciais, mas não se manifestou tanto por situações climáticas. Esse  estudo fez projeção de que atingiremos 35.770 casos no dia 31 de julho se continuarmos nessa mesma projeção geométrica. É muito impactante, mas quando examinamos a proporção desta curva, verificamos que situação é plausível se não for contida a contaminação”, alertou,

O estudo estima que, se mantido esse aumento de casos, no dia 11 de agosto, 200 pacientes precisarão de atendimento em leitos de UTI, de modo que haverá “um possível colapso do sistema de saúde pública do Estado no mês de agosto”.

O apelo é ainda maior para Campo Grande, onde pesquisa aponta que grande parte da população é obesa, hipertensa e tem diabetes, comorbidades que associadas ao Covid-19 representam maior risco de pacientes desenvolverem o caso grave da doença.

Procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho, Cândice Gabriela Arósio, também alertou para a mudança no cenário da Covid-19 no Estado. 

“A situação tranquila que vivenciamos ao longo desses 100 dias que já passamos, se mostra de forma que demanda atenção da população. Todos os esforços para que pudéssemos passar de forma tranquila estão sendo feitos, mas como estamos acostumados a ver Mato Grosso do Sul em último colocado na lista, ficamos mais dispostos a voltar a rotina normal da vida. Ocorre que nosso inverno está chegando, situação epidemiológica está mudando e a contaminação ampliando de forma considerável, principalmente no sul do Estado”, disse. 

Procurador do MPF afirma que a situação é temporária e que mesmo sendo incômodo, é necessária a colaboração para passar pelo momento crítico.

“Vamos em conjunto tentar ir adaptando nossa rotina, é uma transição que estamos enfrentando e cada dia nos aproximamos de uma solução, que é a vacina. É uma luz no horizonte, já está em teste, há um horizonte e está próximo. Entramos em período de temperaturas em que se agravam problemas respiratórios e demanda leito, devemos nos adaptar para que não chegue ao quadro de esgotamento de leitos, se aproximando disso já há indicativo de fechamento”, afirmou,.

LOCKDOWN

Diante do aumento expressivo de casos e mortes, a medida imediata encontrada é o de alertar a população, mas os órgãos não descartam recomendar medidas mais rigorosas caso os decretos não sejam cumpridos e a curva continue crescente, entre elas, o lockdown.

“Se a população não conseguir aderir [aos decretos], o Ministério Público será obrigado a adotar medidas judiciais no sentido de retomar regras rígidas em relação aos setores sociais e econômicos. Infelizmente será medida necessária para salvar vidas. Temos ciência que prejudica o setor econômico, mas o setor econômico será prejudicado se perder muitas vidas e também dos funcionários que se afastam para tratamento”, alertou Filomena. 

Já o procurador da República, do MPF, afirma que o que orienta as decisões do MPF são os indicadores epidemiológicos, que são essencialmente o número de casos, velocidade de transmissão e taxa de ocupação de leitos, que estão sendo acompanhados e, até o momento, a orientação é o cumprimento de decretos para evitar medidas mais rígidas. 

Estamos acompanhando taxa de ocupação dos leitos de UTI, se caminhar com ascendência da curva, em breve chega a 100% de ocupação. São escolhas difíceis e, por isso, temos nos antecipado para que não cheguemos a esse quadro [lockdown]. Se a população aderir ao que já tem é um bom caminho, mas pode surgir outras orientações, mas até o momento o fundamental é uso de máscara e não aglomerar”, disse.

Ele acrescentou ainda que a orientação é o caminho para evitar que se chegue a uma maior restrição, mas que ela não está descartada porque o objetivo principal é a manutenção de vidas.

“Final de março a prefeitura restringiu atividades econômicas, no passo seguinte foi iniciado processo de flexibilização, é onde estamos hoje. Mas se chegar a um momento que a taxa de ocupação de leitos avançar para próximo de 95%, até antes, pode voltar aquele período anterior de restrição da atividade econômica e circulação. Preocupação não é só com SUS, a pessoa tem percepção que tem plano de saúde e se precisar vai ter leitos, mas não vai, o vírus afeta ricos e pobres. Antes de fechar estamos pedindo com antecedencia colaboração das pessoas”, acrescentou.

A promotora da Saúde afirma que endurecimento de medidas não é apenas o fechamento de todas as atividades essenciais, mas também medidas contra a população, que é o próximo passo.

“Esse é o momento de as medidas serem adotadas contra a população. Na esfera judicial, vários infratores foram encaminhados para a delegacia. Podemos incidir em legislação com pena branda, como em outras medidas, inclusive os que tem teste positivo e não cumprem quarentena podem responder por crime contra a saúde pública, com pena mais exacerbada. Não temos intenção de punir, a intenção é que a população cumpra seu compromisso e responsabilidade social”, explicou,

Ela explicou ainda que a recomendação de fechamento das atividades econômicas não pode ser feita com antecedência, mesmo com a previsão de colapso, porque são necessários indicadores porque sem eles não há legitimidade técnica para a esfera judicial e, dentro dos limites da razoabilidade, esses requisitos não estão preenchidos.

“Quando se adotam medidas restritivas, o ideal é que seja em gradação, você não pode partir de flexibilização total para fechamento total. Hoje, o período que vivemos é uma tentativa de conciliar interesses econômicos e de outro lado a saúde. A balança tá pesando mais em favor da economia e saúde está ligando um alerta, estamos chamando população para ser nossa parceira, vamos em conjunto tentar adaptando nossa rotina”, afirmou Pedro Gabriel. 

Nota conjunta afirma que são advertidos e convocados “todos os cidadãos para cumprirem rigorosamente os Decretos Municipais, sob pena de serem adotadas medidas restritivas mais drásticas, encerrando-se o processo de flexibilização das medidas sanitárias, com o retorno ao quadro mais rigoroso de restrições adotadas no início da pandemia em março deste ano”, CORREIO DO ESTADO