Plantas podem afastar o mosquito da dengue? Entenda limitação desta estratégia contra o Aedes aegypti

Algumas espécies têm compostos químicos com propriedade repelente, mas, segundo especialistas, a duração é limitada e tem baixa efetividade em um contexto de epidemia.

Por Júlia Carvalho, g1

A citronela é uma das plantas que têm propriedades capazes de afastar o mosquito da dengue. — Foto: Fernando Stankuns / Flickr / Creative Commons

A citronela é uma das plantas que têm propriedades capazes de afastar o mosquito da dengue. — Foto: Fernando Stankuns / Flickr / Creative Commons

Quando o assunto é dengue e plantas, o foco costuma ser sempre o mesmo: os pratinhos que acumulam água e permitem que o Aedes aegypti – transmissor da doença que já acumula mais de 3 milhões de casos em 2024 – se reproduza com facilidade.

🌱 Mas ao levantar o olhar e se atentar às folhas de determinadas plantas, outra questão pode surgir. Algumas espécies são capazes de repelir o mosquito?

Os especialistas explicam que sim, algumas plantas como a citronela têm compostos químicos que ajudam a afastar o Aedes, mas também listam três principais problemas desse tipo de repelente (veja mais detalhes abaixo):

  • Duração muito limitada de tempo e abrangência do efeito;
  • Risco de alergias no contato dessas plantas com a pele;
  • Baixa efetividade dos repelentes naturais em um contexto de epidemia.

Efeito repelente limitado

Apesar do efeito repelente natural, os especialistas explicam que essa propriedade é limitada e muito inferior aos repelentes industrializados, com eficácia aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Rafael Maciel de Freitas, chefe do Laboratório de Mosquitos Transmissores de Hematozoários do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), comenta que determinadas plantas que exalam um estímulo olfativo mais forte podem ser capazes de afastar o Aedes aegypti momentaneamente, mas o efeito não é duradouro.

“O efeito de repelência das plantas é temporal e espacialmente limitado. Se o cômodo for muito grande, por exemplo, ela não vai ser capaz de repelir totalmente o mosquito”, afirma.

Outro ponto importante é que a quantidade de plantas no ambiente, ainda que sejam de espécies com alguma propriedade repelente, não influencia na duração do efeito.

Maria Anice Sallum, professora do departamento de epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP, explica que as substâncias responsáveis por afastar o mosquito estão dentro dos tecidos das plantas e não ficam constantemente sendo dispersas no ambiente.

“Na planta, o efeito de repelência é baixo e o produto não está exatamente disponível no ar, não há um aerossol que espalha a substância no ambiente. Além disso, há outros compostos na própria planta que podem atrapalhar essa ação de afastar o mosquito”, detalha Maria Anice Sallum.

Ambos explicam que para ter uma eficácia maior, o ideal é que se extraia o óleo dessas plantas, processo que concentra e potencializa o efeito de repelência.

Risco para alergias

Além do efeito limitado que as plantas possuem como repelentes, seu uso inadequado pode trazer risco à saúde.

Rafael Freitas alerta que não há nenhuma evidência científica que comprove que esfregar essas plantas no corpo, por exemplo, aumente o efeito repelente e alerta para o perigo desse tipo de prática. “Além de não ajudar a afastar o mosquito, isso pode, inclusive, causar outros problemas, como urticárias e alguns tipos de alergia”, pontua.

A professora Maria Anice Sallum também comenta que, mesmo no caso dos óleos e extratos concentrados, é preciso ter cuidado.

“Ao comprar, é importante se certificar de que o produto é puro, sem ser diluído em nenhum tipo de álcool ou com a presença de outras essências. Isso influencia na efetividade do produto como repelente, além de poder causar algum tipo de reação”, analisa.

Combate aos criadouros

Mesmo podendo contribuir localmente para afastar os mosquitos, as plantas não têm um efeito repelente bom o suficiente para serem efetivas no combate da epidemia.

“Apesar de existirem plantas que têm essa função de repelência, pensando na situação de transmissão atual, as plantas não substituem os inseticidas, os repelentes sintéticos e as ações de combate dos criadouros”, pondera Maria Anice.

Os especialistas explicam que o controle epidemiológico está, na realidade, muito mais atrelado a combater a reprodução acelerada do mosquito do que a matar a forma adulta do Aedes.

Para isso, reforçam os alertas para que as pessoas verifiquem, ao menos uma vez na semana, se há água parada nos pratinhos das plantas ou em outros possíveis criadouros dentro de casa.

“A repelência é uma solução paliativa. Você não vai matar o mosquito, vai somente afastá-lo. Vale muito mais à pena fazer o monitoramento na casa para eliminar criadouros, porque essa sim é uma solução duradoura”, compara Rafael Freitas.