Grãos digitais: ‘tokenização’ visa revolucionar operações de barter no Brasil

Startup argentina chega ao Brasil para transformar um milhão de toneladas de grãos em ativos digitais lastreáveis já em 2023

O produtor de soja necessita de uma nova plantadeira para semear a próxima safra. Para adquiri-la, que tal contar com a oleaginosa recém-colhida na atual temporada e pagar à vista? É esse tipo de modelo de negócios que a tokenização de commodities agrícolas propõe.

Quem está à frente desta espécie de evolução do barter é a startup argentina Agrotoken, que já iniciou suas operações no Brasil, com foco inicial em Mato Grosso, onde já digitalizou oito mil toneladas de grãos. E a meta para 2023 é audaciosa: fazer o mesmo com 1 milhão de toneladas por todo o país.

O foco inicial é a soja, o milho e o trigo, mas a empresa tem planos para carne e etanol a médio prazo. Se tudo ocorrer da maneira esperada, o produtor terá mais poder de travamento de preços e previsibilidade em suas compras.

O diretor Anderson Nacaxe, aliás, explica que, futuramente, o plano é aproximar o consumidor comum do Primeiro Setor, ou seja, diante de uma perspectiva de aumento da picanha ou do álcool, pessoas comuns teriam condições de garantir o churrasco ou adquirir tanques de combustível com os preços antigos e diretamente com os fornecedores. “No entanto, partiremos para esse estágio só a partir do momento em que o produtor estiver bem atendido”, salienta.

Início das operações brasileiras

bandeiras do Brasil e Argentina, fronteira

Startup argentina tem agora no Brasil o seu grande alvo. Foto: Pixabay

Na Argentina, a startup já transformou 250 mil toneladas de grãos em ativos digitais e oferece, inclusive, mecanismo físico para o agricultor fazer suas compras com os grãos tokenizados de forma rápida e sem burocracia: um cartão bandeira Visa.

A parceria com a gigante dos cartões também será realizada no Brasil ainda em 2022, de acordo com o executivo. “Podemos estimular muitos produtores a tokenizar os seus grãos e temos muitos deles querendo, mas precisamos, primeiramente, garantir que ele tenha onde usar porque se não estaremos criando um ativo que ele gera e não consegue fazer nada”, ressalta.

Desta forma, o objetivo é estimular a aceitação direta dos grãos tokenizados. “A parceria com a Visa é a garantia ao produtor de que mesmo que não tenha um lugar que aceite token diretamente, é possível usar o sistema em qualquer lugar que aceite cartões, sendo uma linha de crédito adicional que se pode usar o tempo todo. Porém, nosso mundo ideal é oferecer ao produtor uma lista de lugares em que ele pode utilizar seu token diretamente em lugares que o aceitam”.

O CEO da Agrotoken, Eduardo Novillo Astrada, por sua vez, acredita que esse modelo será interiorizado pelo agricultor brasileiro com relativa facilidade.

“O produtor já pensa em grãos quando planeja uma compra. Uma picape custa tantas sacas de soja é um raciocínio comum. Para se ter ideia, 40% das negociações entre Brasil e Argentina são feitas por barter. O grão já atua como uma moeda de troca e a tokenização formaliza todo esse processo”, explica.

Adesão dos produtores à tokenização

Produtor de soja analisando lavoura. Foto: Marcelo Lara/Canal Rural

Falando em confiança do produtor, o diretor da empresa ressalta que os tokens agrícolas são lastreados e fungíveis, ou seja, baseados em ativos físicos, como a produção de soja e milho comercializada, por exemplo. Assim, diferenciam-se das criptomoeadas.

“No ato da emissão do token, a plataforma realiza uma compensação em volume do montante correspondente ao lastro e ao montante em tokens do grão”, conta Nacaxe.

No entanto, para que o produtor possa fazer uso das commodities digitalizadas, é necessário que todo um ecossistema se forme. E isso inclui cooperativas, tradings e bancos, além das fabricantes de máquinas e implementos agrícolas, por exemplo.

Astrada garante que as conversas estão avançadas nessa direção e que nos próximos dez anos, espera ter no Brasil 50% dos produtores com, ao menos, 40% de sua produção tokenizada.

Um token, uma tonelada

De acordo com o diretor da startup, os tokens emitidos são equivalentes a uma tonelada de grãos. Ainda assim, o agricultor tem a oportunidade de digitalizar e utilizar apenas uma fração dessa produção. Foi isso, inclusive, o que aconteceu com um produtor de milho da Argentina que em agosto deste ano foi a uma cafeteria da rede Starbucks e adquiriu uma bebida com seu cartão em uma operação que lhe custou 0,021 tonelada do cereal.

Para a soja, o diretor da Agrotoken explica que a praça brasileira que balizará os preços será Sorriso (MT). “Nossa plataforma identificou que se trata da praça mais estável a variações de preço da soja no Brasil”, conta. Assim, cada commodity terá seu próprio indicador. CANAL RURAL