Governo recomenda lockdown em Campo Grande

Governo recomenda lockdown, prefeito da Capital só aceita medida se englobasse toda a região central

Mais uma vez, equipes do governador Reinaldo Azambuja e do prefeito Marcos Trad não falaram a mesma língua
01/08/2020 09:30 – Daiany Albuquerque, Eduardo Miranda


O prefeito de Campo Grande, Marcos Trad (PSD) e o governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB) não tem falado a mesma língua durante a pandemia da Covid-19. 

Governo do Estado

O governo tem seguido recomendações da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), braço na América do Sul da Organização Mundial de Saúde (OMS), para indicar abertura ou fechamento do comércio. A prefeitura tem preferido se manter resistente às medidas mais duras, indicadas para conter a curva de contágio da Covid-19.

A sexta-feira, dia em que Campo Grande encerrou o mês de julho com 121 mortes por Covid-19 (foram 129 em toda a pandemia) foi um dia tenso nos corredores da prefeitura e também da Secretaria Estadual de Saúde (SES). 

O motivo foi a classificação do programa Prosseguir, do governo de Mato Grosso do Sul, que colocou a Capital no nível de cor preta, que representa um grau extremo, em que só o lockdown é suficiente para frear a disseminação do coronavírus.

A classificação feita pelo governo de Mato Grosso do Sul ocorreu um dia depois de o prefeito Marcos Trad liberar o comércio em geral, além de academias, shoppings e restaurantes, e outras atividades não essenciais, para funcionar neste sábado e domingo, ao contrário do que ocorreu nos últimos dois fins de semana, quando apenas as atividades essenciais eram permitidas.

“Isso é tarefa para o governador do Estado!”, disse Trad, ao ser entrevistado pelo jornal televisivo MS1. 

A resposta veio quando o prefeito foi questionado se adotaria o lockdown em Campo Grande, como o governo recomenda, e se procuraria os prefeitos das cidades vizinhas (que enviam pacientes para os hospitais da Capital).

Marcos Trad, tensão 

Trad, até que alguém diga o contrário, é aliado do governador Reinaldo Azambuja, e espera contar com o apoio dele em sua campanha de reeleição. A pandemia, porém, torna o caminho entre o Paço do Municipal, na Avenida Afonso Pena, e a Governadoria, no Parque dos Poderes, cada vez mais distante.

Para o prefeito, um lockdown só seria eficaz na Capital se as outras 34 cidades que fazem parte da macrorregião de Campo Grande, e que também encaminham pacientes para a cidade, tomassem a mesma medida. Entretanto, segundo dados do governo do Estado, de todas as internações no município, apenas 22% são de outras cidades. 

Outro fator é que, da macrorregião da Capital, apenas Campo Grande está em grau extremo em relação à pandemia da Covid-19.

“Eu sou prefeito de uma cidade que possui a menor taxa de letalidade entre as Capitais, eu sou prefeito de uma cidade que tem o maior número de recuperados, eu sou prefeito de uma cidade que hoje está disponível 44 leitos de UTI, eu sou prefeito de uma cidade que, graças a Deus e as medidas que nós tomamos, nesse efeito sanfona (…) está dando certo, porque o lockdown?”, argumentou o prefeito.

Guerra de Números

Há quem não concorde com a declaração do prefeito. 

A situação atual de Campo Grande é considerada preocupante por várias autoridades de saúde e especialistas. 

Segundo dados do governo do Estado, que recebe a atualização da ocupação de leitos de todos os estabelecimentos, ontem a cidade tinha ocupação global de leitos de UTI de 90% (tanto de vagas do Sistema Único de Saúde como da rede privada). A prefeitura afirma que o setor está em 84%.

A cidade tem quase 10 mil casos confirmados (9.875) e em 24 horas acrescentou 231 episódios do novo coronavírus e 10 mortes a sua contagem, que já chega a 129, com uma letalidade de 1,3%.

Para o infectologista e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Julio Croda, que participa de uma pesquisa mundial com aval da OMS para testagem da vacina BCG para imunizar contra a Covid-19, se o lockdown não for decretado na cidade, os leitos de UTI já devem começar a faltar a partir da próxima semana na cidade.

“Já tem dados científicos que o paciente grave que não tem leito de UTI disponível tem mais chance de ir óbito”, declarou. Sobre a eficácia do lockdown, o pesquisador usou como exemplo, cidades onde a medida foi implantada.

“É só falar de Milão, Nova Iorque. A redução da taxa de contágio caiu de 3.18 para 0.68, então funciona”.

Comerciantes

Por outro lado, o 1º secretário da Associação Comercial e Industrial de Campo Grande (ACICG), Roberto Oshiro, afirmou que a implantação do mini lockdown, que funcionou nos últimos dois fins de semana em Campo Grande, não tiveram impacto na curva de contágio da Capital e nem a ocupação de UTIs.

“A gente fez um estudo no nosso departamento de economia, aumentaram os casos de contágio, não diminuíram, o mini lockdown não resolveu para nada, então todas essas medidas restritivas que impactaram a economia, causaram desemprego, deixaram famílias sem o seu ganha-pão, eles não resolveram a questão da pandemia. Morreu gente do mesmo jeito”, declarou. Correio do estado.