Computação quântica: como será a internet super-rápida do futuro

Computação quântica: como será a internet super-rápida do futuro

Imagine computadores super-rápidos que podem resolver problemas em muito menos tempo que as máquinas de hoje. Esses “computadores quânticos” estão sendo desenvolvidos em laboratórios ao redor do mundo. Mas cientistas já se antecipam e começam a pensar em uma internet quântica baseada em sinais de luz a ultrarrápida.

Não é simples criar uma tecnologia para um aparelho que ainda não foi tecnicamente inventado, mas comunicações quânticas são um campo atrativo, porque a tecnologia permitirá o envio de mensagens que são muito mais seguras.

Mas, antes disso, há diversos problemas que precisam ser resolvidos para que a internet quântica funcione:

* Fazer computadores quânticos se comunicarem entre si;

* Garantir a proteção contra hackers;

* Transmitir mensagens por longas distâncias sem perder parte delas;

* Direcionar mensagens por uma rede quântica.

Mas o que é um computador quântico?

É uma máquina capaz de solucionar problemas computacionais muito difíceis de forma incrivelmente ágil.

Em computadores convencionais, a unidade de informação de “bit” e pode ter um valor 1 ou 0. Seu equivalente no sistema quântico – o qubit (bit quântico) – pode ser 1 e 0 ao mesmo tempo. O fenômeno permite que múltiplos cálculos sejam realizados simultaneamente.

No entanto, qubits precisam ser sincronizados usando um efeito quântico conhecido como entrelaçamento, o que Albert Einstein chamou de uma “ação fantasma à distância”.

Há quatro tipos de computadores quânticos sendo desenvolvidos, que usam:

* Partículas de luz;

* Íons presos;

* Qubits supercondutores;

* Centros de vacância de nitrogênio observados em diamantes imperfeitos.

Computadores quânticos permitirão uma série de aplicações úteis, como modelar variações de reações químicas para descobrir novos medicamentos, desenvolver tecnologias de imagem para a indústria de saúde a fim de detectar problemas no corpo ou acelerar a forma como são desenvolvidas baterias, novos materiais e eletrônicos flexíveis.

Poder de processamento

Computadores quânticos podem ser mais poderosos que computadores clássicos, mas algumas aplicações exigirão ainda mais poder de processamento do que um computador quântico oferece por si só.

Se for possível fazer com que essas máquinas se comuniquem entre si, elas poderão ser conectadas para formar um enorme computador. Mas, como há quatro tipos de computadores quânticos sendo criados hoje, eles não conseguirão se comunicar sem alguma ajuda.

Alguns cientistas defendem que a internet quântica seja baseada inteiramente em partículas de luz (fótons), enquanto outros acreditam que seria mais fácil criar redes quânticas em que a luz interagisse com a matéria.

“Luz é melhor para comunicação, mas qubits de matéria são melhores para processamento”, diz Joseph Fitzsimons, pesquisador do Centro de Tecnologias Quânticas da Universidade Nacional de Cingapura, à BBC. “Você precisa de ambos para fazer a rede trabalhar para estabelecer a correção de sinal, mas é difícil fazê-los interagir.”

É muito caro e difícil armazenar toda informação em fótons, diz Fitzsimons, porque essas partículas não conseguem ver umas as outras e passam reto entre si, em vez de se chocarem. O especialista acredita que seria mais fácil usar a luz para comunicação e armazenar informação usando elétrons e átomos (na forma de matéria).

Criptografia quântica

Uma aplicação crucial da internet quântica será a distribuição de chaves quânticas, em que uma chave secreta é gerada usando um par de fótons entrelaçados e usada para criptografar informação de uma forma que é impossível para um computador quântico quebrá-la.

Essa tecnologia já existe, e foi primeiro demonstrada no espaço por uma equipe de pesquisadores da Universidade Nacional de Cingapura e da Universidade de Strathclyde, no Reino Unido, em dezembro de 2015.

Mas não é apenas dessa criptografia que precisaremos no futuro para garantir a segurança de nossa informação. Cientistas também estão trabalhando em “protocolos cegos de computador quântico”, que permitem ocultar qualquer coisa em um computador.

“Você pode escrever algo, enviar para um computador remoto e a dona da máquina não conseguirá saber nada a respeito, a não ser a duração do processamento (do arquivo) e a quantidade de memória que usou”, diz Fitzsimons.

“Isso é importante porque provavelmente não haverá muitos computadores quânticos quando eles surgirem, então, as pessoas vão querer rodar programas neles, como fazemos hoje com a nuvem.”

Há duas abordagens possíveis para fazer uma rede quântica – com comunicações em terra ou pelo espaço. Ambos os métodos funcionam para enviar bits comuns de dados pela internet atual, mas, se quisermos enviar dados como qubits no futuro, será muito mais complicado.

Para enviar partículas de luz (fótons), podemos usar cabos de fibra óptica em terra. No entanto, os sinais de luz se deterioram ao longo de grandes distâncias, porque os cabos às vezes absorvem a luz.

É possível evitar isso ao construir “estações de repetição” a cada 50 km. Elas seriam basicamente laboratórios quânticos em miniatura que tentariam reparar o sinal antes de enviá-lo adiante para o próximo nódulo da rede. Mas esse sistema tem suas próprias complexidades.

Terra ou espaço?

E há as redes espaciais. Digamos que você queira enviar uma mensagem do Reino Unido para a Austrália. O sinal de luz é enviado de uma estação em solo britânico para um satélite com uma fonte de luz instalada nele.

O satélite envia o sinal de luz para outro satélite, que então envia o sinal para uma estação em solo australiano, e a mensagem pode ser transmitida por meio de uma rede quântica em terra ou por uma rede tradicional de internet para o destinatário.

“Como não há ar entre os satélites, não há nada para degradar o sinal”, diz Jamie Vicary, pesquisador do departamento de Ciência da Computação da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e membro do Hub de Tecnologias de Informação Quânticas em Rede (NQIT, na sigla em inglês).

“Se você de fato quiser ter uma internet quântica em escala global, soluções com base no espaço parecem ser a única forma de fazê-la funcionar, mas é a mais cara.”

O teletransporte quântico pelo espaço já foi realizado com sucesso, e cientistas estão tentando provar que é possível fazer isso através de distâncias cada vez maiores.

Membros da Academia de Ciências Chinesa foram parar nas manchetes em junho quando conseguiram teletransportar fótons entrelaçados entre duas cidades na China localizadas a 1,2 mil km de distância entre si. Eles usaram um satélite quântico especial chamado Micius.

Os mesmos cientistas chineses superaram recentemente o próprio recorde ao, em 29 de setembro, realizar a primeira ligação intercontinental por vídeo protegida por uma chave quântica, com pesquisadores da Áustria, a uma distância de 7,7 mil km.

A ligação durou 20 minutos, e os participantes foram capazes de trocar fotos criptografadas do satélite Micus e do físico austríaco Erwin Schrödinger.

Rupert Ursin, membro do Instituto de Óptica e Informação Quânticas da Academia de Ciências Austríaca, acredita que a internet quântica demandará redes em terra e pelo espaço operando em paralelo. “Nas cidades, precisamos de redes de fibra, mas as conexões a grandes distâncias terá de ser realizada com comunicações por satélite.”

Como funciona uma chave de distribuição quântica?

Para entender como funciona uma chave quântica, precisamos voltar à chamada de vídeo entre cientistas chineses e austríacos. O satélite Micius usou sua fonte de luz para estabelecer conexões ópticas com as estações em terra na Áustria e na China. Foi então capaz de gerar uma chave quântica.

O mais interessante da criptografia quântica é que você pode detectar quanto alguém tentou interceptar a mensagem antes de ela chegar ao destinatário ou quantas pessoas tentaram acessá-la.

O Micius foi capaz de dizer que a criptografia não havia sido violada e que ninguém estava ouvindo à ligação. Deu então o ‘ok’ para criptografar os dados usando a chave secreta e transmiti-los por uma rede pública de internet.

Mensagens

Diversos grupos de cientistas estão desenvolvendo redes em terra ao trabalhar em tecnologias de estações de repetição quânticas, localizadas a cada 50 km, conectadas por cabos de fibra óptica.

Essas estações, conhecidas como “nódulos de rede quânticos”, precisarão realizar diversas ações para direcionar as mensagens pela rede.

Primeiro, cada nódulo precisa reparar o sinal e potencializar o sinal que ficou prejudicado ao percorrer os 50 km anteriores da rede.

Imagine que você esteja usando uma máquina de fax para enviar um documento de uma página para outra pessoa e, cada vez que você manda a página, uma parte diferente da mensagem fica faltando, e o destinatário precisa juntar as partes da mensagem obtidas em cada tentativa.

Isso é similar a como uma única mensagem pode ser enviada entre diferentes nódulos em uma rede quântica.

Haverá muitas pessoas na rede, todas tentando falar umas com as outras. Então, o nódulo, ou a estação repetidora, terá de descobrir como distribuir o poder de processamento disponível para montar todas as mensagens sendo enviadas. Também terá de enviar mensagens entre a internet quântica e a internet clássica.

A Universidade de Delft está construindo uma rede quântica usando vacâncias de nitrogênio em diamantes, e isso demonstrou até agora ser capaz de armazenar e distribuir as conexões necessárias para comunicações quânticas a grandes distâncias.

A Universidade de Oxford e a Universidade de Maryland (EUA) estão construindo computadores quânticos que funcionam de forma similar a uma rede. Consistem em nódulos de íons presos que foram conectados em rede para se comunicarem.

Quanto maior for o computador desejado, mais nódulos serão necessários adicionar, mas esse tipo de computador quântico apenas transmite dados a curta distância.

“Queremos fazer com que sejam pequenos para que sejam bem protegidos da degradação do sinal, mas, se forem pequenos, eles não conseguirão armazenar muitos qubits”, diz Vicary.

“Se conectarmos nódulos em rede, então, ainda podemos ter um computador quântico sem precisar limitar o número de qubits e ainda assim proteger os nódulos.”

Memória quântica

A estação repetidora também precisará um chip de memória quântico. Os nódulos criam “conexões”, que consistem em pares de partículas de luz entrelaçadas. Esses pares são preparados com antecedência.

Enquanto o nódulo calcula a rota pela rede que a mensagem terá de percorrer, ele terá de armazenar o par de fótons entrelaçados em algum local seguro, então, a memória quântica é necessária. Ela terá de armazenar os fótons pelo tempo que for necessário.

Pesquisadores da Universidade Nacional Australiana (ANU, na sigla em inglês) desenvolveram um chip de memória quântica compatível com telecomunicações usando um tipo específico de cristal. Esse invento é capaz de armazenar luz na cor correta e de fazer isso por mais de um segundo, o que é 10 mil vezes mais do que todas tentativas realizadas até agora.

“O principal desafio é demonstrar uma memória quântica com uma capacidade de armazenamento grande”, diz Matthew Sellars, da ANU. “Será a capacidade de armazenamento que limitará a transmissão de dados pela rede. Acredito que levará cinco anos antes que a tecnologia (para a internet quântica) seja algo usada na prática.”

Fonte: BBC Brasil