Por falta de provas, juiz rejeita pedido de aborto legal a jovem estuprada

Por falta de provas, juiz rejeita pedido de aborto legal a jovem estuprada
Por entender que não há elementos suficientes na ação para comprovar que houve estupro, o juiz Fernando Paes de Campos negou pedido de aborto feito por uma jovem que reside em Campo Grande. Na decisão, ele alega não haver nada além do Boletim de Ocorrência, registrado três meses depois do suposto ato, anexado ao processo.
“No caso dos autos, o boletim de ocorrência foi registrado mais de três meses depois do alegado estupro, época em que, é lícito supor, a autora já tinha conhecimento da gravidez. Além deste boletim de ocorrência policial, há nos autos apenas as mensagens de que passam muito longe de convencer sobre a ocorrência de um estupro”.
Ressalta que o aborto é legal somente em dois casos para não ser tipificado como crime: o primeiro que a gravidez seja resultante de estupro, e o segundo que o aborto seja precedido de consentimento da gestante.
“Assim, resta evidente, que ao contrário do que aduz a exordial, faz-se necessário, para que a tutela seja deferida, dilação probatória onde se demonstre elementos mínimos que indiquem que a gravidez que se pretende interromper resulte, de fato, de estupro”.
Nos autos a jovem alega que estava alcoolizada e, portanto, não houve consentimento pára haver relação sexual que, por sinal, foi sem preservativo. Contudo, para o magistrado, “sobre o inquérito policial, onde talvez já tenha sido ouvido o suposto estuprador, não veio notícia alguma nos autos”.
Caso – A suposta vítima relata que os exames para comprovar a violência sexual foram feitos. Ela passou por avaliação no Hospital Regional, perante equipe multidisciplinar, fez novos exames e anamnese (entrevista feita pelo profissional de saúde).
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Todos os documentos necessários foram preenchidos. Porém, 15 dias depois, recebeu resposta negativa de procedimento por parte da equipe, que, conforme os autos, “apenas justificou a violação de direito com a “ausência de concordância unânime” na equipe, o que não é nem de longe imprescindível para a realização do procedimento”.
Quando foi violentada, ela era menor e chegou a se mudar para outros estado, contudo, ao perceber as mudanças no corpo e constatar a gravidez, decidiu voltar à capital sul-mato-grossense. Relata na inicial que conversou com familiares e optou pelo aborto.
A defesa da jovem impetrou mandado de segurança, que teve a petição inicial indeferida pelo juízo, que entendeu que o caso demanda provas de que houve o referido estupro. O Boletim de Ocorrência e outras documentações estão anexados ao novo processo.
“A impetrante não teve acesso a nenhum laudo técnico, apenas teve o procedimento negado de maneira injustificada. A portaria mencionada, entretanto, normatiza a realização da interrupção da gravidez e o suprimento da possível ausência de B.O, mas as condições para que ela possa ocorrer encontram-se, como mencionado, na Norma Técnica sobre Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes”.
A argumentação usada é de que “o que temos da norma técnica do ministério da saúde é que o abortamento deve ser garantido à vítima de violência sexual caso sejam preenchidos dois requisitos: Estar e idade gestacional de no máximo 22 semanas e com o produto de concepção pesando até 500g”.
No referido caso a jovem estava na 19ª semana de gravidez quando ingressou com ação e tem o produto de concepção pesando apenas 186 gramas. “Ela, então, preenche os requisitos para que seja realizado o aborto humanitário, de modo que a negativa do sistema de saúde em fazê-lo configura violação a direito líquido e certo da impetrante”.
A defesa chama atenção, ainda, para o fato de que a realização do procedimento de interrupção da gravidez, como dito, é feito a partir de uma justificação ao próprio órgão de saúde pública, conforme regulado pela portaria 1.508/GM.
“Não é necessário sequer o registro de boletim de ocorrência policial, uma vez que a representação criminal é faculdade da vítima, bem como o abortamento, de modo que não se pode condicionar o exercício de um direito a outro”.