ARTIGO:Coração árido

Coração árido
A cobiça pode ser entendida como um desejo desmedido pelo poder, dinheiro, bens materiais, glórias.
Alci Massaranduba
O renomado escritor russo Leon Tolstoi escreveu uma fábula rica em ensinamentos, ela se refere a um camponês ferido da cobiça de terras. Não podendo conseguir do patrão quanto desejava, procura outro senhor, que lhe diz que, com o dinheiro que tem, pode receber toda a extensão de terra em volta da qual ele seja capaz de andar até ao pôr-do-sol. O camponês concorda alegremente, e o dono das terras coloca seu boné sobre um torrão e lhe diz que pode andar até onde quiser, em círculo, voltando ao boné antes de se pôr o Sol, e toda a parte assim rodeada lhe pertencerá.
A princípio o camponês anda calmamente, mas logo adiante vê um pedaço de terra muito boa, ótima para plantar milho, e então alarga o círculo a fim de incluir aquele trecho. Mais adiante descobre um pedaço excelente para o cultivo de batatinhas, e aligeira o passo para incluí-lo também. Outro magnífico lote de terra lhe chega ao alcance da vista, e outro mais, e outro ainda.
Muito sofrimento poderia ser evitado se a moléstia da cobiça.”
— Alci Massaranduba
Para abranger tudo aquilo, tem que correr, e assim faz; primeiro a passo cadenciado, depois com toda a força. Afinal conclui que já basta, e nota com apreensão que o Sol está bem perto do horizonte e o boné ainda fora de vista. Estica os passos, mas tem os pés feridos e sangrentos, dói-lhe a cabeça, os pulmões arquejam como uma forja de ferreiro, as veias se acham tensas e inchadas, o coração bate como um malho contra as costelas. Redobra os esforços e afinal avista o boné. Está exausto, todos os nervos tensos, a cabeça parece nadar-lhe, e diante dos olhos vê uma névoa rubra. Mas os ouvidos latejantes percebem os estridentes aplausos dos circunstantes, e com esforço sobre-humano estende a mão para o boné. Mas antes de atingi-lo cai exânime, o Sol se põe e ele jaz morto.
A cobiça pode ser entendida como um desejo desmedido pelo poder, dinheiro, bens materiais, glórias. O cobiçoso deseja o que é do outro, e se pudesse tomaria isso a força e pegava para si. A fábula de Tolstoi exemplifica muito bem o processo da cobiça no coração humano. Quando o desejo é maior que a razão não há limites para se chegar ao resultado esperado. Infelizmente, até mesmo a alegria e o sorriso farto de alguém pode gerar um sentimento tão nefasto numa pessoa a tal ponto que métodos antiéticos e ilegais são utilizados como se fosse algo banal, sem nenhuma importância. Quantas vidas já não foram destruídas, quantos relacionamentos não foram desfeitos, quantas amizades já não foram esmagadas? Muito sofrimento poderia ser evitado se a moléstia da cobiça não se multiplicasse em velocidade tão assustadora.
A época que vivemos é de comparações, tudo é medido pelo tamanho do “sucesso” de alguém e isso não significa unicamente a posse de bens matérias, pois há figuras ilustres que cobiçam a vida de simplicidade de meros desconhecidos assim como há pessoas humildes que cobiçam a vida de luxo e conforto dos abastados. Lamentável é que algumas pessoas gastam todas as suas energias e tempo se preocupando em demasia com que o outro faz e possui e se esquece de viver a própria vida. Há a ilusão de que se tomar algo do outro para si uma milagre venha a acontecer como se toda a estima baixa, as frustrações e as injustiças desapareçam na rapidez de um estalar de dedos. Ledo engano!
Alci Massaranduba – Autor dos livros “Minha Vida de Carteiro” e “Pensamentos de um Carteiro”. Bacharel em Administração de Empresas com Habilitação em Comércio Exterior pela UEMS e Especialista em Gestão Empreendedora de Negócios pela UNIGRAN.